terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

[Novidades BD] Jem and the Holograms: Showtime GN





Autor:
Kelly Thompson
Artista: Sophie Campbell e M. Victoria Robado (cores)
Editora: IDW
Data de Publicação: 27 Outubro 2015
Cópia fornecida pela editora para efeitos de review.
Review da versão em língua inglesa.


Com o Secret Agent Month a bem que em pausa devido a motivos de força maior (prometo que recomeço assim que puder!), vim trazer, em jeito de desculpas, esta rápida opinião sobre uma novidade de BD. 
Capa Jem and the Holograms: Showtime

Crónicas de uma Leitora de BD

Num mundo de banda desenhada que ainda está virado sobretudo para os leitores masculinos, é interessante encontrar um lançamento onde as protagonistas e a vasta maioria do elenco não só são mulheres, mas são mulheres normais, sem serem mega badasses estilo Lara Croft, Shi ou Vampirella. Não, não vou começar um monólogo da vagina aqui sobre a falta e má representação das mulheres nos comics (guardo isso para outro dia). O que me intrigou nesta Graphic Novel foi como uma história centrada em protagonistas femininas e virada sobretudo para as mulheres (caso não tenham topado pela quantidade de cor-de-rosa com que estão a levar), conseguiu ser aprovada para publicação por uma editora não-indie.
 

Jem e as Hologramas

Para quem não sabe o que é, a “Jem and the Holograms” era o que eu chamo “Série de Anúncios Animados” dos anos 80. Esta série apareceu numa altura em que haviam leis nos Estados Unidos a restringir fortemente a publicidade de brinquedos a crianças – as corporações deram a volta a isso, criando séries de desenhos animados que, basicamente, funcionavam como anúncios aos brinquedos que tinham para vender. 

Imagem publicitária da série original
Fica desde já aqui um segredo para quem era fã dos desenhos animados dos Transformers e ficou traumatizado com a morte do Optimus Prime no filme (o de desenhos animados, não do Michael Bay): foi tudo porque a Hasbro queria introduzir uma nova linha de Transformers e precisava de retirar os Autobots antigos da série. Capitalismo, minha gente! Nada como traumatizar criancinhas por diversão e lucro.  

Jem and the Holograms tinha um objetivo semelhante – mas apontado às raparigas. Felizmente, ninguém tinha que morrer para se venderem bonecas novas: a Jem e as Holograms mudavam de visual de forma dramática durante a série, e novas personagens e bandas eram introduzidas a cada poucos episódios.

A série durou 60 e pouco episódios, distribuídos por 3 temporadas, e nunca teve a popularidade dos Transformers, logo foi rapidamente esquecida – há rumores que passou em Portugal no Canal Panda nos inícios da televisão por cabo (coisa que nunca tive porque o meu pai não gostava de pagamentos mensais, e levamos com satélite que nos lixamos), logo, todos os (poucos) episódios que vi foram online e quando já era crescidinha. No entanto, sempre foi um sucesso underground, com grupos de fãs altamente devotados. Eu culpo a estupidamente viciante música do genérico.


A sério, ouçam isto e digam-me se não ficam com o raio da música na  cabeça o resto do dia. Especialmente a parte das Misfits...


Lacinhos Cor-de-Rock
A transformação Jerrica\Jem

Inspirados pelo aparecer da MTV e pelas Magical Girls do anime que começavam a serem populares na altura, Jem and the Holograms segue as aventuras de Jerrica Benson e o seu alter-ego “Jem”. Qual Hannah Montana, Jerrica é uma rapariga normal que, com a ajuda do supercomputador Synergy e dois projetores holográficos escondidos nos seus brincos (ei, não sou eu que invento estas coisas), se transforma na super-estrela musical Jem ao gritar "It's showtime, Synergy!" Pelo caminho enfrenta outras bandas, como as suas némesis, The Misfits, que, convenhamos, fazem trinta por uma linha e, se isto fosse o mundo real, já tinham levado com um processo e acabado em tribunal há muito. Jem tem que lidar com a pressão de uma vida dupla, trabalhar na sua caridade para raparigas órfãs enquanto tenta triunfar com a sua banda.

Capa de Jem and the Holograms #11
Obviamente, como era uma série sobre bandas de música, todos os episódios tinham um ou dois temas musicais cantados pelas bandas – que eram infelizmente muito fraquinhos (se procurarem no youtube de certeza que encontram exemplos). As Misfits não só tinham mais personalidade como melhor musica (afastando-se do muito mais delicodoce tom pop da Jem, e tendo alguns travos de rock e até punk). É ligeiramente revelador da era que a banda que prefere rock, usa cores mais fortes (e evita o rosa), e apregoa nas suas músicas coisas com independência, não querer ficar em casa e ser uma “boa esposa”, ter mais que fazer que andar atrás de rapazes, etc. seja a banda das vilãs. Ironicamente, era também a banda mais competente, e com melhor música. 


Jem and the Holograms: Showtime

Depois desta ridiculamente longa introdução, passemos à graphic novel em si. Jem and the Holograms: Showtime compila os primeiros 6 fascículos da BD Jem and the Holograms. A história mantem-se muito próxima da série, o que se resume, simplesmente, a:


 
As minhas reviews andavam com uma séria falta de Star Wars, por isso tomem lá.

Pois. É a história de um bando de miúdas a baterem-se por fama, bandas a quererem ser conhecidas, andarem à lapada, sabotarem-se e vencerem concursos de popularidade. 

Não posso criticar muito porque claramente a autora estava a tentar escrever para os fãs, que, convenhamos, bem merecem, enquanto atualizando a série para um novo milénio. Nunca poderia ser muito diferente. No entanto, consegue fazer algo que a série nunca conseguiu: tornar as personagens interessantes. Ao dar-lhes personalidades distintas e complexas (e explicar a necessidade da Jerrica usar a Jem devido à sua timidez patológica, em vez de só “porque sim”) o livro deixa de ser só uma fantasia para meninas que querem ser a próxima Madonna, e torna-se uma história sobre quatro irmãs, e os seus problemas pessoais e relações. 

Não é o melhor plot do mundo, mas não é por isso que estamos a ler. Estamos a ler porque as pessoas são interessantes, e porque nos importa que consigam ser felizes. Não vou cometer o erro de dizer “ai, quem gosta de Deadpool ou super-heróis não vai gostar” porque, francamente, eu gosto de ambos e gostei disto também. É diferente, mas um bom diferente.


 
Redesign das Jem and the Holograms

Quem vê corpos não vê corações

Normalmente, deixo o comentário sobre a arte em jeito de fecho, visto que muito raramente compro BD pela arte, e foco-me muito mais na história, mas tive que dar especial destaque à arte desta graphic novel. A Sophie Campbell tem um estilo muito próprio, que pode ser um gosto adquirido, mas eu adoro-a. E adoro sobretudo a tendência dela desenhar vários tipos de corpos, não se focando só nos corpos “Barbie” que todas as protagonistas tinham na série. 

Redesign das The Misfits

Os redesigns dela são adoráveis, e incluem várias raças e variados tipos corporais, e até uma rapariga que tem um nariz proeminente\não é atraente de forma convencional, mas continua a ser bonita. E gosto muito de como ela conseguiu atualizar os looks de toda a gente, para fora do inferno dos anos 80 a que estavam condenados.
Se vos mostrei o Loki Unicórnio claro que vos ia 
mostrar as "lesbianas". Toma lá, Diácono Remédios!

E agora temos que falar do elefante lésbico na sala. Sim, uma das personagens principais gosta de meninas, e o storyarc dela baseia-se fortemente no romance complicado que tem com uma das Misfits. Não há tentativas de esconder isto, ou fingir que é só “amizade”, por isso se lesbiatrónicas vos fazem espécie, evitem esta série ou vão ter um chilique.

Para além disso, a artista conseguiu resolver (parcialmente) um dos grandes problemas que é transferir desenhos animados com som (e música) para o meio estático que é a BD: a representação gráfica da música e até estilo de cada banda funciona muito bem (dentro dos limites, claro), dando a entender a personalidade e individualidade de cada. Não é tão bom como ouvir a música, claro, mas é o melhor possível (e vejamos, a música da série não era extraordinária, logo não se perdeu muito).


Tocatta e Fuga

Por fim, a quem recomendo esta série? Aos fãs de Jem, sem dúvida. Às pessoas que gostam de ler “slice of life” e das relações entre irmãs. Recomendaria também a quem gostava de experimentar ler BD e tem medo de pegar nos calhamaços de Marvel e super-heróis. É um livro mais orientado para o público feminino, sem dúvida, mas acho que há por aí muito público masculino que era bem capaz de apreciar. 
Também recomendo como uma excelente BD para o público-alvo original da série, raparigas dos 10 anos para cima – é um ótimo ponto de entrada para criar o gosto pela banda desenhada. Ao ser focada em relações de irmandade e amizade transmite uma boa mensagem, e, ao ser protagonizada, sobretudo, por raparigas, torna-se algo com que as leitoras mais jovens se identificariam facilmente.


Se julgaram que o Michael Bay estragou as Tartarugas Ninja...
... ainda não viram mesmo NADA.

Não havia um filme qualquer?
 
Não falamos nisso. Nunca falamos nisso. 

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