Shadowhunters, Shadowhunters... O que dizer sobre esta série que já tanta tinta fez correr e tantas opiniões polarizou desde a sua estreia há meros três meses atrás?
Da maneira como eu vejo as coisas, há duas opções em relação ao modo como esta adaptação pode ser encarada: o purismo, defendido por fas que raramente conseguem separar-se de todo e qualquer detalhe, por mais insignificante que seja; ou a abertura de mente para apreciar que o meio escrito e o meio audiovisual são inerentemente diferentes, requerem tratamentos diferentes, e que ser diferente não significa necessária e obrigatoriamente ser mau.
Quem me conhece pessoalmente saberá que a minha perspectiva no que toca a adaptações vai mais ao encontro da segunda mentalidade; ou seja, estou aberta a mudanças, liberdades artísticas e até mesmo a cortes e acrescentos ao material original. Na maioria das vezes, admito, sob a condição de que pelo menos a essência da história seja mantida, mas até isso tem espaço para manobra dependendo da situação. Por isso, sim, acertaram. Estão absolutamente correctos: Shadowhunters tem o meu selo de aprovação!
Se é uma adaptação fiel até ao último ponto e vírgula? Não, de todo, nem de perto ou mesmo de longe. Se tem melhorias que precisam de ser feitas e arestas que precisam de ser limadas? Sim, sem dúvida, e eu pretendo falar delas aqui mais tarde. Mas, ainda assim, sendo eu uma pessoa que gosta de ver as coisas pelo lado positivo, deixem que comece por referir os aspectos em que acho que Shadowhunters se pode vir a tornar-se um dos programas de televisão com mais relevância na cultura popular dos nossos dias.
Uma das melhores cartadas jogadas pela equipa de produção desta adaptação? A diversidade racial e étnica do elenco que escolheu. Para onde quem que olhemos nas nossas televisões, somos constantemente deparados com cinquenta sombras não de cinza, mas de branco. A realidade do nosso mundo não é essa, a nossa sociedade é extremamente variada, pintá-la constantemente com as mesmas cores é prejudicial, e é portanto necessário, benéfico e agradável de ver essa preocupação em aumentar a diversidade cultural que vemos retratada seja em que meio for.
'Mas o Luke não é Afro-Americano nos livros', reclamam uns. 'E a Camille é suposto ser loira!', bradam aos céus outros. 'Os olhos azuis do Alec! Ó meu Deus, onde estão os olhos azuis do Alec!?!", descabela-se a maioria. E agora pergunto eu: fez mesmo alguma diferença integral para quem as personagens são intrinsecamente que a sua cor de pele ou olhos tenha sido outra? Ao, não fez. Deixemos picuínhices de lado e sejamos honestos, por favor. As personagens que vemos em Shadowhunters podem ser diferentes dos seus equivalentes literários, sim, e tal é abertamente demonstrado em várias ocasiões ao longo dos episódios. Maioritariamente, ainda assim, tal facto prende-se com as escolhas que os guionistas e produtores resolveram adoptar no que toca à maneira como cada um dos elementos do elenco se relaciona com o arco geral do enredo. Garanto-vos que a quantidade de melanina que cada um deles aparenta ter não influencia minimamente a pessoa que é suposto serem.
O facto de que essa diversidade existe no elenco permite-lhes, aliás, demarcar mais profundamente ainda do que nos livros os paralelos que é suposto existirem entre a relação de racismo Shadowhunters/Downworlders e o que infelizmente continua a acontecer até aos dias de hoje entre Brancos/Pessoas de Cor, à falta de melhor expressão. Luke, um lobisomem, é negro. Camille, uma vampira, é asiática. Magnus, um feiticeiro, é também asiático. Raphael e Simon, ambos vampiros , são latinos. Até Meliorn, um Fae, é representado por um actor com ascendência do Médio Oriente. As personagens caucasianas? A grande maioria dos Shadowhunters, a raça dita dominante. Aliás, podemos até ir mais longe ao ponto de referir o grande vilão da história que, sendo um extremista racial e religioso com claros laivos de inspiração nas doutrinas de Hitler, é obviamente um homem branco a abusar do seus dos privilégios e da sua adquirida certeza do seu lugar no mundo.
Esta temática tem estado presente durante toda a temporada e, sendo bastante pertinente à nossa própria realidade, é uma mais valia que os produtores de Shadowhunters aproveitem os temas base da história que estão a adaptar e consigam aprofundá-los e explorá-los de maneira a poderem fazer a sociedade rever-se no pequeno ecrã. Afinal, é ou não verdade que de cada vez que ligamos a televisão ou abrimos um jornal ultimamente somos constantemente deparados com toda a discussão à volta do tema dos refugiados? Se vivermos nos Estados Unidos, país onde esta série tem origem e que inclusivamente serve de cenário para o enredo, é especialmente pertinente que se tentem abordar e criticar estes assuntos sempre que possível. Os Estados Unidos são, afinal de contas, um dos países com mais racismo e xenofobia no mundo. Em média, morrem anualmente entre 1000 a 1500 pessoas vítimas de actos de violência derivados de racismo e descriminação... E isto são apenas os números das mortes que, infelizmente, ocorreram às mãos da polícia.
Shadowhunters é, neste momento, a série de ficção com o elenco mais diverso da televisão, e o seu uso de opressão ficcionada como metáfora para opressão racial pode vir a ser uma imensa ajuda no que toca à normalização de assuntos culturais e raciais. Vindo de uma série de fantasia, não é sequer esperado que haja interesse ou muito menos preocupação em espelhar problemas com que lidamos na vida real! Afinal, não é para isso que existem os telejornais? Ou os documentários? Ou até mesmo a escola onde os adolescentes vão todos os dias supostamente aprender pelos livros de História todas as coisas terríveis que aconteceram no passado e que não devemos repetir? A infeliz verdade é que já ninguém tem paciência para telejornais, documentários muito poucos vêem, e os adolescente estão mais preocupados com os jogos que vão jogar ou a TV que vão ver quando chegarem a casa. E, assim sendo, a introdução quase que subliminar de temáticas deste género e de diversidade cultural a um nível quase sem precedente em projectos como Shadowhunters servem para atrair e representar um maior e mais variado número de espectadores, através da correlação de elementos realistas dentro de um universo de fantasia, ao mesmo tempo que ajudam a que o público alvo da série seja exposto e educado em assuntos de interesse e importância quase sem se aperceber ou que isso se torne uma tarefa enfadonha de exposição factual atrás de exposição factual.
Shadowhunters é, neste momento, a série de ficção com o elenco mais diverso da televisão, e o seu uso de opressão ficcionada como metáfora para opressão racial pode vir a ser uma imensa ajuda no que toca à normalização de assuntos culturais e raciais. Vindo de uma série de fantasia, não é sequer esperado que haja interesse ou muito menos preocupação em espelhar problemas com que lidamos na vida real! Afinal, não é para isso que existem os telejornais? Ou os documentários? Ou até mesmo a escola onde os adolescentes vão todos os dias supostamente aprender pelos livros de História todas as coisas terríveis que aconteceram no passado e que não devemos repetir? A infeliz verdade é que já ninguém tem paciência para telejornais, documentários muito poucos vêem, e os adolescente estão mais preocupados com os jogos que vão jogar ou a TV que vão ver quando chegarem a casa. E, assim sendo, a introdução quase que subliminar de temáticas deste género e de diversidade cultural a um nível quase sem precedente em projectos como Shadowhunters servem para atrair e representar um maior e mais variado número de espectadores, através da correlação de elementos realistas dentro de um universo de fantasia, ao mesmo tempo que ajudam a que o público alvo da série seja exposto e educado em assuntos de interesse e importância quase sem se aperceber ou que isso se torne uma tarefa enfadonha de exposição factual atrás de exposição factual.
Eu gosto imenso dos livros e os primeiros episódios de facto costuram-me um pouco porque ainda estava à espera que fossem semelhantes ao livro. Mas de facto consegui fazer a separação e acho que a série está muito boa, aliás os atores têm vindo a evoluir como é o caso do Alberto Resende que continua a ser o meu preferido. E concordo plenamente contigo acho extremamente importante que a diversidade étnica surja afinal ninguém está confinado ao local originário da sua etnia...
ResponderEliminarBeijinhos, Bea
Uma das coisas sobre a qual pretendo falar nestas minhas análises é o conceito de adaptaçao em geral em correlaçao com esta adaptaçao em particular, por isso brevemente poderás ler todos os meus balbuceios em relaçao a isso :) E espero que as análises te continuem a agradar!
EliminarO Alberto é, sem dúvida, um dos actores a quem a personagem assentou que nem uma luva. Ainda por cima este é o primeiro trabalho profissional dele!
Depois de ler os livros, assisti aos primeiros episódios,acabei por desistir.... só tenho a dizer (de cortar os pulsos)
ResponderEliminarCada um como cada qual, como se costuma dizer :)
EliminarAdmito que a série posso nao agradar a todos e percebo os motivos de cada um. Eu faço parte do grupo de pessoas que apoiou e apreciou a série desde o princípio, mas para pessoas que inicialmente pareciam desagradas com os episódios a opiniao geral parece ser que ao longo dos episódios começaram a gostar mais do rumo e da maneira como as coisas estavam a ser feitas.
Em todo o caso, um dos meus objectivos com estas análises seria idealmente criar uma troca de opiniao e uma saudável discussao com os nossos leitores, por isso espero poder contar com o teu ponto de vista em futuros posts, uma vez que é contrário ao meu :)
Antes de mais, parabéns por esta excelente análise, vai sem dúvida de encontro ao que eu penso sobre a adaptação desta série. Li os livros todos num ápice e depois de ver o último episódio não resisti e estou a relê-los! Confesso que no início me metia um bocado de confusão o rumo que estavam a dar à série. No entanto, penso que estas pequenas alterações à história original eram importantes, senão o leitor já saberia o que esperar no próximo episódio. Dei por mim a contar os dias para descobrir os novos desenvolvimentos da série, e agora vamos ter de esperar mais uns mesitos para ver o que se vai passar na próxima temporada! Fico também a aguardar por novas análises :)
ResponderEliminarObrigada pelo teu comentário e pelo teu interesse nestas análises. Amanha em princípio haverá outra, sobre outra temática, dentro do universo de Shadowhunters :)
EliminarE concordo plenamente contigo, uma das coisas que mais me agradou foi que, ao mesmo tempo que tentavam manter a essencia da história original, tentavam simultaneamente torná-la diferente q.b. para que quem tivesse lido os livros nao 'sofresse' com a previsibilidade do enredo.
Adorei a tua analise. Li os livros todos e ainda que goste mais dos livros, gosto da descoberta dos detalhes alterados na série, gosto de ser surpreendida com a adaptação! Parabéns pelo blogue! Vou aguardar novos desenvolvimentos que é como quem diz novas análises!
ResponderEliminarTal como disse à Daniela na resposta ao comentário dela, essa foi exactamente uma das coisas que me agradou na maneira como eles fizeram a adaptaçao: os elementos novos que trouxeram à história para evitar a previsibilidade a quem já tenha lido os livros. E para mais, a série ainda agora começou. Com sorte, terá um bom futuro pela frente para se desenvolver e melhorar. Em todo o caso, essa vai ser uma das minhas análises: a adaptaçao em si e os pontos em que falhou e os que, pelo contrário, acertou em cheio.
EliminarAmanha, em princípio, será publicada mais uma parte da análise. Espero que continue a agradar. E obrigada pelos elogios!